O famoso mito da
caverna, ilustrado por Platão no livro VII de A República possui, para além da
crítica feita àqueles que não procuram o conhecimento da essência das coisas,
mantendo-se presos à sua aparência sensível, uma implicação política. O
filósofo, ao sair da caverna em que se conhece apenas a sombra, a aparência das
coisas, as conhece em si mesmas, conhece a sua essência, e deve então retornar
ao interior da caverna, isto é, deve retornar ao meio das pessoas comuns, para
orientá-las em direção ao conhecimento verdadeiro. A implicação política de seu
argumento é a de que o filósofo, como portador do conhecimento verdadeiro, deve
governar a cidade, pois age através da razão e é esta quem deve orientar a vida
humana. É o sábio quem deve governar.
Em
sua utopia, Platão considera impróprio que o governo de uma cidade seja
exercido pelas classes militares ou econômicas. No primeiro caso, o poder
político poderia ser degenerado pelo impulso guerreiro e o governante se
tornaria um tirano, alguém que governa com poderes ilimitados, podendo revogar
a legislação quando bem entender, governando através do uso da força.
Atualmente, esta forma de governo é vista no ocidente de modo negativo; no
Brasil, tivemos uma experiência de tirania parecida com a criticada por Platão,
ainda que bastante diferente, durante os anos da ditadura militar que teve
inicio com o Golpe de 1964 e vigorou até 1985.
O segundo caso
criticado por Platão, o governo pela classe econômica, a oligarquia, seria
também condenado porque então o governo se concentraria apenas nas mãos dos
ricos ou nobres que poderiam governar em benefício próprio, sem se preocupar
com as condições de vida das camadas mais pobres da população. Também tivemos
esta experiência no Brasil durante as primeiras décadas da República, quando as
decisões mais importantes para o país eram tomadas por ricos proprietários de
terra, principalmente de Minas Gerais e São Paulo, no que ficou conhecido como
“política do café com leite”. Os ricos proprietários de terra mineiros e
paulistas revezavam-se no poder, impedindo que outros grupos políticos
aparecessem e propusessem novas direções para o país, uma vez que isto
diminuiria os privilégios da elite agrária.
Contudo, o que nos
surpreende hoje ao ler a filosofia política de Platão é que o filósofo
condenava também a democracia. Sua teoria de que os filósofos devem ser os
governantes exclui automaticamente a participação do povo no governo. Apenas um
pequeno número de pessoas pode se tornar filósofo, pode conhecer a essência das
coisas e conseqüentemente a essência da política, pois poucas são as pessoas
que agem segundo a razão. Desse modo, a maioria não pode governar, pois a
maioria das pessoas se deixam dominar pelas partes baixas da alma, o que impede
a reflexão e o conhecimento racional, necessários para bem governar a cidade.
Platão também criticava a igualdade democrática, pois, segundo ele, o valor
pessoal é sempre desigual, pois alguns são melhores do que outros. Igualando a
todos em função do desejo de liberdade, a democracia se esqueceria de que o
valor pessoal de cada um é diferente, e daria abertura à tirania, pois, se não
se conferisse uma liberdade total aos cidadãos, estes se indignariam e se
revoltariam contra o governante que os representa, banindo-o e tornando-se,
eles próprios, tiranos pouco preocupados com a legislação, suspensa sempre que
se desejasse mais liberdade.
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