terça-feira, 11 de março de 2014

Trecho de A República, de Platão

“Pois bem!, a meu ver, a democracia aparece quando os pobres, tendo conquistado a vitória sobre os ricos, chacinam uns, banem outros e partilham igualmente, com os que sobram, o governo e os cargos públicos; e frequentemente estes cargos são sorteados. [...]
Em primeiro lugar, não é verdade que eles são livres, que a cidade transborda de liberdade e de franqueza de palavra, havendo nela licença para fazer o que se quer? [...]
Ora, é claro que toda parte onde reina tal licença cada qual organiza a vida do modo que lhe apraz. [...]
Assim é possível que ele [o governo democrático] seja o mais belo de todos. Qual uma vestimenta variada que oferece todo tipo de cores, este governo, ao oferecer toda variedade de caracteres, poderá afigurar-se de rematada beleza. E talvez muitas pessoas, semelhantes às crianças e às mulheres que admiram as variações, decidirão que é o mais belo. [...]
É, como vês, um governo agradável, anárquico e variado, que confere uma espécie de igualdade tanto ao que é desigual como ao que é igual. [...]
Ora, não será o desejo insaciável deste bem [a liberdade] e a indiferença por tudo o mais, que muda este governo e o compele a recorrer à tirania? [...]
Então, se os que a governam não se mostram totalmente dóceis e não lhe servem larga medida de liberdade, ela os castiga, acusando-os de criminosos e oligarcas. [...]
Ora, vês o resultado de todos esses abusos acumulados? Concebes, efetivamente, que tornam a alma dos cidadãos de tal modo assustadiça que, à menor aparência de coação, estes se indignam e se revoltam? E chegam por fim, bem sabes, a não mais se preocupar com leis escritas ou não-escritas, a fim de não ter absolutamente nenhum senhor. [...]
Pois então! este governo tão belo e tão juvenil é que dá nascimento à tirania, pelo menos no meu pensar.”


PLATÃO. A República. 2ª Ed. São Paulo: Difel, 1973, pp. 162 – 172 apud ARANHA, M. L.; MARTINS, M. H. Filosofando: introdução à filosofia. 3ª ed. rev. São Paulo: Moderna, 2003, p. 226.

Platão e a democracia

O famoso mito da caverna, ilustrado por Platão no livro VII de A República possui, para além da crítica feita àqueles que não procuram o conhecimento da essência das coisas, mantendo-se presos à sua aparência sensível, uma implicação política. O filósofo, ao sair da caverna em que se conhece apenas a sombra, a aparência das coisas, as conhece em si mesmas, conhece a sua essência, e deve então retornar ao interior da caverna, isto é, deve retornar ao meio das pessoas comuns, para orientá-las em direção ao conhecimento verdadeiro. A implicação política de seu argumento é a de que o filósofo, como portador do conhecimento verdadeiro, deve governar a cidade, pois age através da razão e é esta quem deve orientar a vida humana. É o sábio quem deve governar.

Em sua utopia, Platão considera impróprio que o governo de uma cidade seja exercido pelas classes militares ou econômicas. No primeiro caso, o poder político poderia ser degenerado pelo impulso guerreiro e o governante se tornaria um tirano, alguém que governa com poderes ilimitados, podendo revogar a legislação quando bem entender, governando através do uso da força. Atualmente, esta forma de governo é vista no ocidente de modo negativo; no Brasil, tivemos uma experiência de tirania parecida com a criticada por Platão, ainda que bastante diferente, durante os anos da ditadura militar que teve inicio com o Golpe de 1964 e vigorou até 1985.

O segundo caso criticado por Platão, o governo pela classe econômica, a oligarquia, seria também condenado porque então o governo se concentraria apenas nas mãos dos ricos ou nobres que poderiam governar em benefício próprio, sem se preocupar com as condições de vida das camadas mais pobres da população. Também tivemos esta experiência no Brasil durante as primeiras décadas da República, quando as decisões mais importantes para o país eram tomadas por ricos proprietários de terra, principalmente de Minas Gerais e São Paulo, no que ficou conhecido como “política do café com leite”. Os ricos proprietários de terra mineiros e paulistas revezavam-se no poder, impedindo que outros grupos políticos aparecessem e propusessem novas direções para o país, uma vez que isto diminuiria os privilégios da elite agrária.

Contudo, o que nos surpreende hoje ao ler a filosofia política de Platão é que o filósofo condenava também a democracia. Sua teoria de que os filósofos devem ser os governantes exclui automaticamente a participação do povo no governo. Apenas um pequeno número de pessoas pode se tornar filósofo, pode conhecer a essência das coisas e conseqüentemente a essência da política, pois poucas são as pessoas que agem segundo a razão. Desse modo, a maioria não pode governar, pois a maioria das pessoas se deixam dominar pelas partes baixas da alma, o que impede a reflexão e o conhecimento racional, necessários para bem governar a cidade. Platão também criticava a igualdade democrática, pois, segundo ele, o valor pessoal é sempre desigual, pois alguns são melhores do que outros. Igualando a todos em função do desejo de liberdade, a democracia se esqueceria de que o valor pessoal de cada um é diferente, e daria abertura à tirania, pois, se não se conferisse uma liberdade total aos cidadãos, estes se indignariam e se revoltariam contra o governante que os representa, banindo-o e tornando-se, eles próprios, tiranos pouco preocupados com a legislação, suspensa sempre que se desejasse mais liberdade.

Lá e de volta outra vez - 2014

Galera,

Volto a postar as matérias completas aqui no blog. Em sala, disponibilizo apenas resumos, ou seja, o essencial que vocês precisam dominar para conseguirem a pontuação necessária. Aqui disponibilizarei textos maiores e coisas afins.
ATENÇÃO: ao entrar no site, procurem, ao lado direito, o marcador relativo ao seu turno. A turma 316, por ter optado por uma inversão na ordem de exposição dos conteúdos, terá marcador próprio no primeiro bimestre. As turmas do noturno utilizarão este mesmo marcador no quarto bimestre. Esclareço em sala. Abraços!