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Nicolau Maquiavel, pintura de Sandi di Tito, no Palazzo Vecchio |
Ao contrário de outros teóricos
políticos, Maquiavel concebe a política como um campo de reflexão autônomo à
ética, mas que não a despreza. Segundo o autor, a natureza humana se repete, se
mantém ao longo do tempo, mas é má, de modo que pressupor a bondade alheia é
expor-se ao perigo e à ruína. Uma vez que o amor não é um sentimento que possa
ser induzido em uma pessoa, e considerada a natureza humana, o príncipe não
deve procurar ser amado, mas temido, pois há meios pelos quais se pode infundir
temor em outras pessoas. No fundo, a distinção maquiaveliana é aquela entre
“ser” e “parecer”: é desejável que o ator político conserve as virtudes de seu
tempo, mas se se deixar guiar por elas, sendo amado e não temido, não
conseguirá manter o poder. Ao mesmo tempo, não deve ser ele odiado por seus
súditos, o que encerraria o mesmo perigo. Em suma, os súditos devem respeitar
as suas leis e temer a sua força.
Fortuna e virtù foram os termos empregados por
Maquiavel para interpretar os dois pólos em torno dos quais giram o sucesso e o
insucesso das ações humanas. A virtù,
que não deve ser confundida com as virtudes cristãs, diz respeito à capacidade
do ator político de agir de maneira adequada no momento adequado, procurando
ganhar e conservar o poder político, sem qualquer finalidade que lhe seja
externa. Partindo deste conceito, Maquiavel desembaraça a política das esferas
da ética e da religião, de modo que estas não a subjuguem. O conceito de virtù é articulado no limite de duas
situações: a mutabilidade do mundo, que tem seus valores e condições
constantemente alterados, e a tendência do ser humano em repetir um
comportamento que foi bem-sucedido em uma dada ocasião. Assim, a virtù é uma capacidade que encontra seus
limites tanto no ator político, que insiste em repetir seus atos quando eles
não são mais eficazes, quanto no mundo, que em sua eterna mutabilidade faz com
que não possamos nos fixar em apenas uma maneira de agir.
O outro pólo da ação política é a ideia
de fortuna, uma força que não pode
ser inteiramente dominada pelos homens, uma força que abre todas as
possibilidades da história aos seres humanos: não sabemos nunca como uma
determinada situação irá evoluir. A imprevisibilidade da fortuna não é motivo para que não se atue politicamente: deve-se
ter esperança em seus secretos desígnios e, ao mesmo tempo, atuar segundo a virtù, de modo adequado às situações
impostas pela fortuna. No capítulo
XXV de O Príncipe, diz Maquiavel:
“penso poder ser verdade que a fortuna seja árbitra de metade de nossas ações,
mas que, ainda assim, ela nos deixe governar quase a outra metade”.